. | E agora, deixa-me mostrar, por meio de uma comparação, até que ponto nossa natureza humana vive banhada em luz ou mergulhada em sombras. Vê! Seres humanos vivendo em um abrigo subterrâneo, uma caverna, cuja boca se abre para a luz, que a atinge em toda a extensão. Aí sempre viveram , desde crianças, tendo as pernas e o pescoço acorrentados, de modo que não podem mover-se, e apenas vêem o que está à sua frente, uma vez que as correntes os impedem de virar a cabeça. | ||
Acima e por trás deles, um fogo arde a certa distância e, entre o fogo e os prisioneiros, a uma altura mais elevada, passa um caminho. Se olhares be, verás uma parede baixa que se ergue ao longo desse caminho, como se fosse um anteparo que os animadores de marionetes usam para esconder-se enquanto exibem os bonecos. [...] Pois esses seres são como nós. Vêem apenas suas próprias sombras, ou as sombras uns dos outros, que o fogo projeta na parede que lhes fica à frente." Platão, República, Livro 7 | |||
Platão (c.428-348 a.C.) não achava que este era o melhor dos mundos. É uma espécie de prisão, escreveu ele, onde estamos trancados em escuridão e sombras. Mas além dessa prisão reside um brilhante e esperançoso mundo de verdades que ele chamou de ideias ou ideais, e é por isso que chamamos essa doutrina de idealismo. Platão desenvolve suas doutrinas idealistas de forma notável na República, onde seu porta-voz, como de hábito, é seu mestre, Sócrates. (Desconhece-se até que ponto Sócrates realmente sustentava os pontos de vista de Platão.) Sócrates compara nosso mundo quotidiano a um "abrigo subterrâneo", uma caverna onde somos mantidos acorrentados. À nossa frente ergue-se uma parede e atrás de nós, uma fogueira. Incapazes de virar a cabeça, vemos somente as sombras projectadas na parede pelo fogo. Nada conhecendo além disso, naturalmente tomamos essas sombras por "realidade". Os seres humanos, nossos companheiros, assim como todos os objectos da caverna, para nós não passam de sombras; não têm, para nós, outra realidade além dessa. Mas se pudéssemos nos libertar das correntes, se pudéssemos ao menos nos virar para a entrada da caverna, poderíamos constatar o nosso erro. A princípio, a luz directa nos seria dolorosa e perturbadora. Porém, logo nos adaptaríamos e começaríamos a perceber as pessoas e objectos reais, que só conhecíamos em forma de sombras. Mesmo assim, devido ao hábito, nos agarraríamos às sombras, ainda acreditando que elas fossem reais, e suas fontes, apenas ilusões. Mas se fossemos tirados da caverna para a luz, cedo ou tarde chegaríamos à visão correta das coisas e lamentaríamos nossa antiga ignorância. A analogia de Platão é um ataque aos nossos hábitos de pensamento. Estamos acostumados, diz ele, a aceitar os objectos concretos que nos cercam como "reais". Mas eles não são. Ou melhor, eles são só cópias imperfeitas e menos "reais" de "formas" imutáveis e eternas. Essas formas, como Platão as define, são as realidades permanentes, ideais e originais a partir das quais (de alguma forma) são construídas cópias concretas imperfeitas e corruptíveis. Por exemplo, cada cadeira em nosso familiar mundo de objectos é meramente uma imitação, ou "sombra", da Cadeira Ideal. Cada escrivaninha é uma cópia da Escrivaninha Ideal, que nunca muda, que existe pela eternidade, e na qual você nunca pode derramar café. Essas cadeiras e escrivaninhas ideais, segundo Platão, não são fantasias; elas são de fato mais "reais" que suas imitações materiais, porque são mais perfeitas e universais. Entretanto, como nossos sentidos corrompidos têm sido sempre enganados, nós somos cegos para o mundo dos ideais. Nossas mentes estão escravizadas a imitações que nós, desta maneira, confundimos com a realidade. Somos prisioneiros em uma caverna filosófica.
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24 de jul. de 2008
Alegoria da Caverna
Publicada por Armando Almas, Magda Campos em 09:58:00
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